5.11.15

Cowork - Campo de Ourique

Estou a trabalhar a partir de casa desde Junho. Trabalhar a partir de casa é uma miragem muito apetecível quando estamos num escritório distante (para onde temos de nos deslocar de carro ou transportes públicos, enfrentando o trânsito, a chuva, o caos), com colegas que são só isso mesmo, colegas (com quem não sentimos afinidade) e com um trabalho que se afasta cada vez mais daquilo que somos. Acontece que trabalhar a partir de casa pode não ser fácil, pelo menos de imediato, ou pode exigir alguma adaptação (o que se complica comigo, que sou um pouco avessa à mudança). Por dificuldade não falo da instabilidade ou ansiedade da vida de freelancer (que existe, mas é conversa para outro post). Falo da necessidade de criação de rotinas para não existirem distracções (e por distracções nem falo de televisão, que para mim é como se não existisse, nem da tentação de atacar o frigorífico com mais frequência - que acontece, sim, mas tem o seu lado positivo: estar em casa permite fazer opções mais saudáveis). Falo da necessidade de criação de um espaço de trabalho e de métodos para que a vida da casa não se intrometa na vida profissional (evitando, por exemplo, dobrar roupa numa hora de produtividade com o argumento de não consigo trabalhar no caos). Felizmente são questões que se resolvem com tempo e, precisamente, alguma adaptação. Para mim, que sou uma pessoa de rotinas, nem deveria ser complicado. Acontece que a minha experiência de começar a trabalhar a partir de casa sofreu um choque inicial: coincidiu exactamente com o arrancar de obras no prédio (berbequins e outros instrumentos barulhentos, de manhã até ao final da tarde, durante mais de um mês) e com o início do Verão - e eu não lido muito bem com calor (dá-me a volta ao sistema nervoso, bloqueio, não trabalho tão bem).

Sabia que não ia ser imediatamente bom, pela necessidade de adaptação, mas foi mais complicado do que imaginava (pelos factores externos que não controlava). Eu cresci no campo, no silêncio natural, e sempre me custou um pouco habituar-me ao barulho constante da cidade. As obras pioraram a minha relação com a casa, com o trabalho, com o Manel. Andei insuportável chata durante algum tempo e tentei procurar uma solução (que surgiu, em forma de biblioteca, mas já falo sobre isso). Curiosamente encontrava-se a decorrer, no início de Junho, o período de apresentação de projectos para o Orçamento Participativo de Lisboa (algo que acontece anualmente). Eu já tinha andado a estudar o processo de candidatura, a pensar sugerir umas lombas para a nossa rua, mas não hesitei em mudar o foco. As ideias surgem muitas vezes da necessidade. Apresentei o projecto Cowork - Campo de Ourique, num processo de candidatura muito simples (apresentar a ideia e justificar a sua importância, tudo online). Não me iria resolver o problema da falta de local de trabalho de imediato (nem para breve) mas senti que fazia sentido tentar (poderei não ser eu a usufruir do mesmo mas gosto de pensar que irá beneficiar alguém no futuro). Muito resumidamente: o projecto prevê a criação de um espaço de cowork (partilha de espaço e recursos de um escritório) em Campo de Ourique com salas para utilização diária, semanal ou mensal por parte de indivíduos com actividade profissional livre (freelancers) - designers, fotógrafos, copywriters, entre outros - que procuram compensar a falta de condições para assumir o arrendamento de um espaço por conta própria e quebrar a monotonia do trabalho a partir de casa.

Os projectos apresentados ao Orçamento Participativo de Lisboa (481 propostas) foram analisados por uma equipa da Câmara Municipal de Lisboa, que avaliou a viabilidade técnica de todos e seleccionou aqueles que iam ao encontro dos critérios estabelecidos (e para os quais estimou os custos envolvidos e prazo de execução). Dessa avaliação resultaram 189 projectos - nomeadamente o Cowork - Campo de Ourique (felicidade!) com um prazo de execução de 18 meses (desespero!) - que se encontram a votação, por parte de cidadãos que vivem, estudam ou trabalham em Lisboa, até 15 de Novembro (na verdade por parte de qualquer cidadão que tenha alguma relação com a cidade). Desafio, assim, quem ainda não o fez, a conhecer a página de divulgação do projecto no Facebook (Cowork - Campo de Ourique), a ler sobre o projecto no site do Orçamento Participativo de Lisboa (ou a conhecer os restantes projectos a votação aqui) e a votar! Acima de tudo convido-vos a votar - são tantos os projectos (consultei apenas alguns mas acredito que haja projectos para todas as freguesias de Lisboa), nas mais variadas áreas de intervenção - alguns bastante prementes - e temos a possibilidade de votar na sua real concretização. É uma oportunidade! É bastante fácil e rápido, no site ou por SMS, até dia 15 de Novembro! Influenciando um pouco, fica a sugestão:


Entretanto, para terminar a minha história: as obras do prédio terminaram e está a chegar o frio (com o qual convivo muito bem). Trabalhar a partir de casa tem vindo a tornar-se mais simpático (é muito bom saber que não temos de sair quando está um temporal lá fora). Sinto que não ando tão impaciente. Já fiz várias experiências de rotinas e penso ter encontrado a ideal: acordo, tomo o pequeno-almoço (tenho sempre muito apetite de manhã), vou ao ginásio e tomo banho. Trabalho em casa de manhã, almoço e saio para a biblioteca. Volto a casa ao final da tarde e por vezes, quase sempre, ainda trabalho mais um pouco ou perco-me em momentos de criatividade culinária na cozinha. A biblioteca tem sido, de facto, a minha salvação (foi a minha salvação no Verão, tem ar-condicionado). Fica a dez minutos de casa a pé e tem wi-fi gratuito - e na verdade sinto-me sempre muito feliz rodeada de livros e acho saudável sair de casa e ver pessoas. Mas não a considero uma solução para sempre, tem algumas limitações: o horário (segunda a sexta-feira, das 10h às 18h, e por vezes sinto necessidade de trabalhar à noite ou ao fim-de-semana), a impossibilidade de deixar o computador ou documentação para o dia seguinte, o ter de sair para a rua (e para a chuva, por exemplo) para atender chamadas ou para lanchar qualquer coisa. Não são limitações graves, repito que a biblioteca tem sido uma salvação, mas não é um local de trabalho. Pode ser que o projecto Cowork - Campo de Ourique seja um dos mais votados... E daqui a dois anos estarei a escrever de lá :)

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